- sexta-feira, abril 29, 2005 -

"O mundo quer-me mal porque ninguém"


O mundo quer-me mal porque ninguém
Tem asas como eu tenho! Porque Deus
Me fez nascer Princesa entre plebeus
Numa torre de orgulho e de desdém.

Porque o meu reino fica para além...
Porque trago no olhar os vastos céus
E os oiros e clarões são todos meus!
Porque eu sou Eu e porque Eu sou Alguém!

O mundo? O que é o mundo, ó meu Amor?
- O jardim dos meus versos todo em flor...
A seara dos teus beijos, pão bendito...

Meus êxtases, meus sonhos, meus cansaços...
- São teus braços dentro dos meus braços,
Via Láctea fechando o Infinito.

Florbela Espanca

Reino, voando por este nosso mundo...
Com asas brancas que me deste no segundo
Em que os nossos olhares se cruzaram.

(ai este poema... é demasiado bonito. Tanto que para o trabalho de Português (benditas aulas!) tivemos que fazer mais uma estrofe e foi esta última que saiu... Gosto e ao mesmo tempo não gosto. Façam do vosso juizo.)
Img: Sara Clark

- domingo, abril 17, 2005 -

Quem és?

Quem serás tu?
Quem és tu para me invadires a mente mais uma vez...? Para me abraçares, me beijares, unir as nossas mãos... de novo? Para me fazeres sentir mil e uma sensações enquanto não estou consciente... Mais viva que nunca... Mais alegre que sempre... Mais amada que sempre...
Quem és tu, para me tocares como me tocas... sem me deixar descobrir o teu rosto... saber quem és.
Está a chover. É de noite. O resto não interessa. Como da outra vez... Arranjaste uma nova maneira de te esconderes, essa tua capa que nos cobre aos dois. Tão perto...
Tento descobrir o teu rosto com as mãos, subo devagar, esperando que não te apercebas. Os meus dedos frios traem o meu percurso pelo teu pescoço quente... Ficas nervoso, pegas-me nas mãos... mostras-me silenciosamente que as minhas encaixam perfeitamente nas tuas... Que quererás tu dizer com isso...?
Insisto, peço te mais uma vez... apenas um vislumbre... Negas-me o meu único pedido e abraças-me com mais força. Sei que te estás a despedir... mas que virias de novo...
Pelo menos, deixa-me uma prova da tua existência...
Desapareceste.
Mas ainda consigo sentir o teu abraço...

- quarta-feira, abril 13, 2005 -

Esperarei por ti


Sinto-me presa,
Num lugar apertado,
Pensando no que seria a proeza
De te ter a meu lado...

Sinto-me esquecida,
Como que arrumada
Num canto do teu coração...

Porquê?
Quem ocupa o meu lugar?
Quem me roubou o trono
Do reino da tua alma?

Puseste-me num altar,
Junto dos teus outros troféus...
Mas guardaste-a a ela,
Na sala mais valiosa,
A sala dos mil céus...

Desisti de lutar,
De lutar por aquilo
Que não me podes nem queres dar...

Mas esperarei sempre...

À chuva!
Ao sol!
Ao vento!

Esperarei sempre...

...Até que se acabe o alento.

- quinta-feira, abril 07, 2005 -

À criança que outrora fui...

Minha pequenina,
Espero que estejas bem e que esta carta chegue ao teu coração ainda a tempo. Ainda não me conheces, mas há de chegar o dia em que me conhecerás melhor que ninguém. Bastará olhares para ti e ver-me-ás. Já fui igual a ti, com o tempo perceberás porquê...
Sei que muito do que vais ler não vai fazer muito sentido para ti, talvez não entendas, mas prometo-te que na altura certa, estas poucas palavras te ajudarão. Talvez então consigarás conhecer-te. E, ao mesmo tempo, conhecer-me também...
Não sei que idade tens agora... Resta-me esperar que não sejas nem demasiado nova, nem demasiado crescida. Espero que ainda aí possas passar um inverno, fazer bonecos de neve com as tuas amiguinhas no pátio da escola, para que esta carta não te faça mal. Talvez um dia percebas porquê. Não te sei dar uma resposta que compreendas agora. Mas não tenhas pressa de crescer.
Crescer... Essa vontade que até eu tenho. Mas quando penso em ti, vejo que não vale a pena. Para te ser sincera, por vezes tenho inveja. Lembro-me de ti, sem medo do futuro, a menina reguila que aproveita todos os dias ao máximo, sem preocupações... Por isso, minha pequenina, continua sempre assim. Olha sempre em frente, faz os teus planos para o que ainda há de vir mas não os compliques. Por vezes, tornamos problemas faceis em bichos de sete cabeças.
Nunca desistas, pequena. Nasceste assim teimosa, porquê mudares? Segue o que o teu coração te manda, não deixes que os outros estraguem o que tens de tão precioso: a tua personalidade. Chegará a altura em que vais ter que aprender a gostar de ti própria. Mas haverá sempre alguem que te ame do teu lado, pronto a estender-te a mão para te ajudar a levantar quando caires. E essas pessoas gostarão de ti pelo que és, com as tuas qualidades, mas também com todos os pequenos defeitos que - tal como tu - aprenderão a gostar e respeitar.
Muitas pessoas cruzar-se-ão no teu caminho. Pessoas que adorarás, pessoas que amarás. Pessoas que odiarás. Mas todas essas pessoas, as que amares e as que odiares, ajudar-te-ão na tua maior descoberta: encontrares-te a ti própria. Aprenderás a aprender com os erros...
Lembra-te sempre que, como dizia o outro, a vida é uma peça de teatro improvisada...
Um beijo daquela que é tu,

O teu possível eu.

- sábado, abril 02, 2005 -

Crueis...

Já vi isto há quase uma hora e as imagens ainda passam pelos meus olhos como um filme de terror. Não consegui ver tudo. Nem cheguei a metade, sequer. Fiquei demasiado horrorizada e chocada... Connosco. Com aquilo que o homem pode ser. Cruel. Vejam pelos vossos olhos... Não aconselho a pessoas sensíveis... Até eu, que já vi dezenas e dezenas destas campanhas de sensibilização, fiquei chocada (pela milionésima vez...).
Agora digam-me só como é que pode haver gente desta...

- sexta-feira, abril 01, 2005 -

Não vou acreditar...


- A minha explicação é simples e rápida. Mas peço-te que não acredites, preciso de ti como sempre foste. Não te quero preocupada. Quero a minha namorada como sempre foi: a rapariga que eu conheci na praia este Verão, de cabelos loiros ao vento, sentada na areia, despreocupada do resto do mundo... Lembro-me, eras só tu e o mar. Mais ninguém podia entrar nesse mundo que tinhas criado por momentos.
- Deixei-te a ti, entraste no teu mundo. Passamos a ser tu e eu, com o mar atrás de nós...
- Sim. Mas o cancro não ficou neste mundo quando segui para o teu... Ele acompanhou-me, tal como me acompanha agora.
- Cancro?
- Sim, amor. Perguntaram-me se queria tentar quimioterapia de novo, desta vez no estrangeiro... mas recusei. Não quero passar os dias que me restam preso a uma cama devido a um maldito cancro do pulmão. Sei que não tenho mais hipóteses. Vou morrer. Vou acabar por deixar este mundo que criaste. Mas quero... quero que quando partir, quero que sejas de novo feliz.
A rapariga tinha a face inundada em lágrimas, e apenas um fio de voz lhe saiu da garganta:
- Feliz? Como queres que seja feliz se tu morreres, paixão? Eu amo-te, e só ao teu lado serei feliz. Não me deixes, amor. Não agora, não me deixes... - implorou ela.
- Por mim. Sê feliz. Ama outra pessoa, como me amas a mim. Ama outro felizardo. Ama alguém que não te faça sofrer.
- Estás a pedir-me que te esqueça? - perguntou ela, soluçando.
- Não, linda. Longe de mim. Vou cá estar sempre ao pé de ti, para te ajudar. E onde quer que esteja, amar-te-ei. Não penses que quero que esqueças o que passamos juntos, porque não quero. Quero que te lembres de nós os dois, que tenhas orgulho daquilo que fizémos, daquilo que criamos... Para que no futuro te lembres de mim com um sorriso nos lábios, que aproveites a vida, que sejas feliz... como se não tivesse morrido.
A rapariga olhou para ele, e com a mão livre limpou as lágrimas, tentando acalmar-se.
- Fazes isso? - insistiu o rapaz.
- Por ti. Vou... ser feliz. Aquilo que quiseres.
- Vais deixar a porta do teu mundo aberta quando eu sair?
Ela desviou o olhar. Não conseguia mirar-lhe as feições como dantes fazia, doia-lhe demasiado. Saber que o iria perder num futuro próximo fazia com que se sentisse à beira de um abismo. Mas amava-o. Amava-o acima de tudo.
- Amor? Amor, olha para mim, por favor - pediu o rapaz.
- Sim, farei. Tudo isso. Porque te amo. E não quero, nem vou acreditar no que me disseste nesta linda tarde de sol.
O rapaz tirou a carteira do bolso das calças e deixou umas moedas em cima da mesa. Ambos se levantaram e, de mãos dadas, caminharam em direcção ao mar, em silêncio, comunicando com o olhar.
O mundo resumia-se a aquilo: o rapaz, a rapariga, e o mar atrás deles.

Img: Lia Saile